sexta-feira, 23 de agosto de 2013

No cinema, a cultura do descartável.

Ele como admirador da História sabia que os livros antigos e sagrados traziam consigo nas linhas ou nas entre linhas a afirmação: “nosso pais nos contaram...”. Ou seja a história de um povo, sua relações sociais, econômicas, sagradas, eram transmitidas de geração em geração, primeiramente de forma oral, depois escrita e com um alerta: “nossos pais nos contaram...”
Ouvira de professores sábios a seguinte profecia que saira dos duscursos do romano Cícero: Não saber o que aconteceu antes do teu nascimento seria para ti a mesma coisa que permanecer criança para sempre.
Naquele dia no cinema ele presenciara cenas de desprezo pelo passado e se preocupara com a geração que estava prestes a assumir lideranças. A palavra dos que viveram o passado e ajudaram a construir o presente era ignorada, como eram ignorada muitas vezes as palavras dos colegas e dele próprio. Os infantes não davam mais importância ao adágio: “...nossos pais nos contaram...”. Talvez por que os próprios genitores não tinham algo a contar, ou porque tal geração estava mais preocupada com a tecnologia presente, julgando-se assim deveras poderosa para ouvir aqueles que haviam vivenciado e feito história. A geração do descartável estava apŕendendo a descartar pessoas e histórias!
Na grande tela aquele dia viveu-se uma metáfora interessante, em um primeiro momento o passado era desprezado com algo sem vida, chato, desinteressante que aos olhos da nova geração nada significava, por isto o desprezo, a intolerância, a falta de respeito de muitos. Em um segundo momento via-se com certo grau de admiração o futuro fictício que talvez ninguém verá em forma presente, porque antes que o futuro tão admirado torne-se realidade, a nova geração tenha descartado tanto a natureza, a vida, pessoas, a própria história, que não tenha tempo suficiente para voltar a atenção para o passado e construir uma nova sociedade, onde respeito, tolerância, admiração pela vida, pelas pessoas, pelos construtores da história deem o tom para evitar erros possíveis e tragédias indesejáveis.
Assim ele chegara a uma conclusão triste: para grande parte da nova geração o presente é um vácuo de desrepeito pelo passado e sem nenhuma perspectiva para o futuro, sem perspecitva pois o Carpem Diem é vivido de forma negativa, vazio, descartável, sem dar ouvidos ao adágio milenar: ...e nosso pais nos contaram!

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

CARTA AO MEU PAI



            Olá,
            Quanto tempo! Lá se vão dezesseis anos que tu partistes. Saudade, velho! Você como diria o Boldrin, “foi fora do combinado!”
            Ontem andei vasculhado o passado, em um tal de youtube que torna o passado tão presente, vi o primeiro jogo que me lembro de ter assistido ao teu lado Brasil X Itália na Copa do Mundo de 82. Jogo memorável, triste, porém memorável. Depois daquele jogo, levaríamos doze anos para comemorar juntos, (foi nossa primeira e última comemoração de um título mundial da seleção) sobre a mesma Itália, naquela sofrida decisão por pênaltis, onde ao final, Baggio mais parecendo um jogador de futebol americano mandou a bola para cima! Foi o mote para nos abraçarmos feito loucos e não deu para conter às lágrimas. Vimos juntos o tão esperado tetra campeonato. Porém não vimos as vitórias e derrotas do Corinthians pós - 97 imagina, foi até campeão da libertadores e do mundo, quem diria?
            Penso que deves estar em um “Estado de Graça”, junto com Sócrates, o brasileiro, de quem eras fã, tomando uma cerveja, vez ou outra, assando uma costela, afinal me ensinaste desde de pequeno que para aqueles que tivessem um coração bom, independentemente de credo, Deus prepararia um banquete. Sempre tiveste um coração bom e aqui na terra uma costela bem assada era teu melhor banquete, imagino então que continuas a saborear algumas conversando com o “doutor” sobre “democracia”, a corinthiana e a política. Democracia da qual você sempre tinha algumas ressalvas e desconfianças.
            Quando partiste fui perdendo o gosto pelo futebol, do qual me ensinara a gostar demais e jogar de menos. O dia que ajudei carregar teu corpo e sepultá-lo, sepultei algo de mim. Mas toda sepultura tem ressurreição e ressuscitando continuei o caminho...
            Andei desistindo de alguns projetos, como por exemplo o de servir à Igreja, a qual amavas e me ensinou a amar. Desisti então de servir a Igreja como padre mas creio que fiz um serviço a própria instituição, hoje quando paro para “conversar” com Deus e com alguns “anjos” que ele colocou ao meu lado tenho a impressão que tomei a decisão correta, creio que minha pessoa prestaria um desserviço à Igreja e a Igreja precisa ser renovada no serviço, disse o Francisco, o de Buenos Aires, seguindo o exemplo do de Assis.
            Sabes que todos estes anos você fez falta. Cometi erros, mas sempre procurei acertar. Tornei-me professor e embora com todas as dificuldades do “ser professor” sinto-me em casa. Olho para a juventude e vejo meu passado ali. Levei tempo, assim como a maioria deles, para entender que estudar também pode ser um prazer.
            Não tenho filhos, pelo menos com meu sangue. Mas aprendi a querer bem aqueles que de alguma forma poderiam ser os meus. Uma sinuca aos sábados e discussões filosóficas e piadas partilhadas com eles não deixam de ser um exercício de paternidade!
            Hoje caminho refazendo a minha vida, e entendo que refazê-la é um processo lento, gradual. Descobri que amar é um exercício não de “mendigar”, mas de “partilhar”, sentimentos, alegrias e tristezas, sem isto não há amor, há sujeição. Entendo que amar é como um poema de Adélia Prado, ser sempre “noivo e noiva”!
            Refaço minha vida acreditando que ela tem uma finalidade, a pensada por Aristóteles: a felicidade. Se fosse resumir hoje esse caminho o faria com uma canção emprestada do Gonzaguinha que também deve estar participando da mesma festa na qual estás e cantaria assim:
Eu apenas queria que você soubesse
Que aquela alegria ainda está comigo
E que a minha ternura não ficou na estrada
Não ficou no tempo presa na poeira
Eu apenas queria dizer a todo mundo que me gosta
Que hoje eu me gosto muito mais
Porque me entendo muito mais também
E que a atitude de recomeçar é todo dia toda hora
É se respeitar na sua força e fé
E se olhar bem fundo até o dedão do pé
Eu apenas queira que você soubesse
Que essa criança brinca nesta roda
E não teme o corte de novas feridas
Pois tem a saúde que aprendeu com a vida
           
            Para encerrar só queria dizer, que há dias em que volto ao passado, como no jogo Brasil X Itália de 1982 e tenho a sensação que tu nunca saíste do meu lado.
            Até um dia...


            CHICO TORRESMO.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

HÁ SEMPRE UM RECOMEÇAR NA LITURGIA DA VIDA

          

        




Ele, por muito tempo, andara meio perdido. Como o Milton, dos mil tons de Minas andava cantarolando:
 
 Solto a voz nas estradas, já não quero parar
 Meu caminho é de pedra, como posso sonhar
 Sonho feito de brisa, vento vem terminar
 Vou fechar o meu canto, vou querer me matar

Roubando uma expressão do poeta do eterno, “na liturgia do tempo” vivera um imenso carnaval, tentado provar a si e aos outros que o seu fazer deveria ser valorizado. Esqueceu que quando se tenta provar algo fazendo muitas coisas, mata-se todo o ser que o sonho possa trazer. No “carnaval” de afetividades mal vividas, mal correspondidas mergulhara de cabeça, se tornara um ogro em carro alegórico. Esquecera-se de si para gritar o quanto necessitava dos ritos de  cumplicidades, mas os ritos escapavam pelas suas mãos. Daquele carnaval saíra machucado, ferido. Lembrou-se dos versos do poeta, o gaúcho Quintana. Versos que para ele era uma releitura da utopia que ele tanto desejara:
 
 Se as coisas são inatingíveis... ora!
 Não é motivo para não querê-las...
 Que tristes os caminhos, se não fora
 A presença distante das estrelas!

Neste lampejo poético resolvera mudar seu “tempo litúrgico” era necessário viver a “quaresma”, deserto, sede, reflexão, introspecção , enfim penitência. O tempo pedia que se encontrasse consigo, que revesse sua capacidade de autodestruição, mas também a sua capacidade de ressureição. Afinal o que é o tempo litúrgico da quaresma senão cinzas onde o ser humano tem a chance de renascer? Exercitar-se para vida, para ressurreição.
Resolveu renascer, se lembrou do quanto gostava da vida. Na penitência de haver errado, de entender que o fazer algo não traz como consequência a felicidade de outrem, resolveu cuidar de seu interior e descobriu que não era tão péssimo, tão tosco, tão chato, tão ruim quando imaginara, descobriu que as cinzas podem purificar, descobriu que mais do que fazer é necessário ser, e para ser é preciso sonhar. Seu tempo quaresmal havia mostrado que ressurgir era necessário e por mais que seus demônios interiores (aqueles do deserto) diziam que  ele era um sonhador, resolvera apostar nos valores que ele acreditara, preferiu a utopia: jogou-se aos sonhos para construir uma nova realidade!
Deste modo ao fim de seu tempo quaresmal, descobriu que o ser humano pode ser ressuscitado para o que já era considerado morto!

Bastava ter a atenção voltada a um olhar angelical e gracioso que alerta sempre:
 
“Por que procurais entre os mortos, aquele que está vivo”!
 
Neste "percurso litúrgico" ele redescobrira e ressuscitara em si a beleza  de cada tempo na graciosa   aventura da vida!